A magistratura rondoniense esteve representada pela presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e coordenadora da Frente Associativa da Magistratura e do Ministério Público (Frentas), juíza Renata Gil, quando participou, nesta terça-feira (6), da audiência pública que tratou sobre a PEC 32/2020 – mais conhecida como a Reforma Administrativa – na Câmara dos Deputados. Inicialmente excluídas do debate, as entidades associativas receberam o convite com poucas horas de antecedência ao início das discussões, logo após a Frentas publicar uma nota manifestando desapontamento.
Ao abrir a sessão, a presidente da AMB, juíza Renata Gil, manifestou preocupações acerca dos efeitos que a Reforma Administrativa pode incidir no serviço público. “O nosso posicionamento inicial é não a reforma, nós entendemos que por motivos fiscais já não é mais o seu mote, ou seja, a economia aos cofres públicos e também não tem relação com a eficiência porque nós temos no sistema brasileiro vários métodos para a aferição dessa eficiência nos serviços públicos. Se esses sistemas não estão funcionando a contento do que a sociedade espera, nós temos que fazer com que esses mecanismos funcionem para a aferição dessa eficiência nos serviços públicos”, afirmou a magistrada elencando algumas instituições como o Conselho Nacional de Justiça, o Conselho Nacional do Ministério Público, as agências reguladoras, as Controladorias Estaduais e Municipais e os Tribunais de Conta, tomando como exemplo.
Na reunião do Conselho de Representantes da AMB, ocorrida na segunda-feira (5), já havia sido alertado que a reforma proposta pelos congressistas não apresenta estudos claros que assegure a economicidade ao erário e lembrou que as carreiras jurídicas possuem formas próprias de controle da eficiência do serviço prestado a população, como é o caso do cumprimento de metas impostas por órgãos internos de controle, como é o caso do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) “Não há a necessidade de qualquer mudança no atual regime uma vez que o controle da eficiência das atividades na magistratura e no Ministério Público já ocorre pelos canais próprios de mensuração do desempenho”, afirma a magistrada que avalia como inconstitucional qualquer emenda que proponha mudanças no regimento da carreira da magistratura e do Ministério Público pelo Legislativo.
O deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP) propôs uma emenda que prevê a inclusão da magistratura e de membros do Ministério Público na reforma como medida de perseguição as carreiras jurídicas que possuem regime jurídico único e diferenciado, o que indica a clara inconstitucionalidade por vício de iniciativa, conforme pondera a presidente da Ameron, juíza Euma Tourinho.
Os parlamentares também tiveram acesso aos dados referentes a produtividade do Judiciário. De acordo com os dados do CNJ são cerca de 80 milhões de processos que tramitam no sistema de Justiça brasileiro, o que corresponde a uma média de sete processos diários para cada magistrado brasileiro, sem importar o tamanho das ações processuais uma vez que há processos que variam de 200 folhas até 400 mil folhas. Totalizando assim, 4.261,78 processos por magistrado e 4.254 peças ofertadas pelo Ministério Público. Ademais, foi apresentado um estudo encomendado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região que indica o peso desse trabalho na saúde da magistratura brasileira tendo relação direta com o excesso de processos que resultam no adoecimento dos magistrados.
A defesa pela prestação do serviço público de qualidade
A PEC 32/2020 também propõe a restrição da estabilidade no serviço público e cria cinco tipos de vínculos com o Estado. Embora a estabilidade passe a ser restrita apenas aos servidores ocupantes de cargos considerados tipicamente de Estado, o Judiciário manifesta preocupações quanto a liberdade do servidor público em exercer suas atribuições de forma independente, sobretudo, na fiscalização de agentes públicos e livres de pressões políticas.
“A proposta fala sobre a demissão do servidor por desempenho insuficiente, mas não especifica as formas de avaliação. Imagine um policial federal que investigue um crime ou improbidade de um administrador público. Com a reforma ele poderá se sentir coagido ou pressionado, uma vez que não terá mais a estabilidade inerente ao cargo para exercer suas funções e ao invés de continuar a investigar, poderá deixar de cumprir sua obrigação legal, por medo de retaliação. Isso é inconcebível, pois a estabilidade permite que o agente exerça suas funções de forma impessoal e observe o interesse público conforme expressa a lei”, alerta a presidente da Ameron, juíza Euma Tourinho que também manifesta preocupações com o fim de vários concursos públicos resultando no possível ingresso de servidores apadrinhados politicamente e sem possuir a capacidade técnica para exercer as funções públicas.
Outra estatística relevante em defesa do funcionalismo público do país se refere ao comparativo do Brasil com os países desenvolvidos no que diz respeito a relação entre o número de servidores públicos e o total da população empregada. De acordo com o levantamento feito pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), o Brasil tem 12,5% da população empregada no serviço público, a Espanha possui 15,3%, Reino Unido 16%, Itália 13,4%, Estados Unidos 15,2% e França 21,9%, totalizando uma média de 17,7%. Portanto, o Brasil estaria abaixo dessas médias com 12,5%.
E no que se refere ao custo do funcionalismo público, o estudo apresentado pela OCDE, indica uma média de 22,6% entre esses países pesquisados, sendo que o Brasil possui apenas 20,3% com relação as despesas do país, ou seja, atrás dos Estados Unidos com 25,5%, Espanha com 27%, Rússia com 27,2% e México com 32%.